Mapa do leite na zona de guerra e possíveis consequências ao negócio
09 de março, 2022
Rússia, Ucrânia e Bielorrússia podem sofrer graves consequências, afetando também outros países. Em 2021, a América do Sul exportou cerca de 52.000 toneladas de produtos lácteos para a Rússia, 68% das quais provenientes da Argentina.
Foto: Agência Brasil
Como está o mapa do leite na zona de guerra e o que pode acontecer ao negócio?
A guerra na Europa tem gerado ondas de choque nos mercados mundiais de commodities. Os cereais e a soja vem atingindo “picos históricos”, com preços nunca antes vistos. O mesmo cenário se apresenta para o petróleo, que - devido às incertezas da economia global - viu os preços disparar.
No caso dos produtos lácteos, vale a pena uma revisão. A commodity "estrella" da Argentina, por exemplo, é um leite em pó integral que, durante vários meses, teve considerável alta de preços. De fato, o último leilão da Fonterra - no início de Março - deixou o produto perto dos 5.000 US$/Ton, um valor histórico raramente atingido.
A produção leiteira na zona de guerra merece uma análise a parte, que foi feita pela consultoria Economía Láctea, para a melhor compreensão de como o conflito afeta a atividade. Para tanto, a empresa levou em consideração o que aconteceu em 2014, quando a OTAN acusou a Rússia de ter abatido um avião da Malaysia Airlines em território ucraniano e impôs uma série de sanções econômicas. O governo russo reagiu bloqueando as importações de vários produtos, incluindo os lácteos da União Europeia, dos EUA, do Canadá, da Austrália e da Noruega.
“Parecia uma loucura, a Europa era o principal fornecedor da Rússia, um dos maiores importadores de produtos lácteos do mundo, pensávamos (acreditando saber o que se passa na cabeça de uma pessoa) que o bloqueio não podia durar; mas já dura mais de 7 anos”, ressaltou a consultoria.
Assim foi em 2020, das 1,07 milhões de toneladas importadas pela Rússia, 83,4% (893.000 toneladas) se originaram na Bielorrússia, seguidas pelo Cazaquistão com 4,5% (48.480 toneladas), pela Argentina com 3,12% (33.450 toneladas), pela Nova Zelândia com 2,9% e pelo Uruguai com 1,4%, todos países se que estavam fora do bloqueio.
Em 2021, soube-se que 52.287 Ton de produtos lácteos foram exportados da América do Sul para a Rússia, dos quais 68,3% vinham da Argentina, 23,0% do Uruguai, 4,3% do Chile, 2,9% do Paraguai e 1,2% do Brasil.
“A produção russa cresceu 3,7% nos últimos 21 anos, atingindo 32,02 bilhões de litros em 2021, com uma elevada percentagem de produtos lácteos informais”, afirma a empresa de consultoria. A qualidade é outro problema que o governo estava atacando, principalmente a substituição da gordura butílica (GB) por óleo de palma sem o deixar claro nos rótulos. “Um terço da GB consumida na Rússia é importada”, reconheceram eles.
O cenário na Ucrânia
O segundo protagonista na zona de guerra é a Ucrânia, um país cuja produção “não parou de diminuir desde o início do século XXI, devido à baixa competitividade das suas explorações leiteiras”. Os 8,8 bilhões de litros que teriam sido produzidos em 2021 representam uma queda de 36% em relação ao volume de 2002. Isto levou a Ucrânia a “passar de exportador líquido de produtos lácteos até 2019 para importador líquido a partir daí”.
De acordo com a consultoria, entre Janeiro e Outubro de 2021, “o país teria importado 163.880 Ton de produtos lácteos, sendo 51,3% da Polónia e o resto principalmente de países da UE”. Quanto às exportações, no mesmo período, teriam sido vendidas 61.543 Ton de produtos lácteos para pouco mais de 60 países.
E a Bielorrússia
O terceiro protagonista é a Bielorrússia, um país que se tornou o principal fornecedor de produtos lácteos à Rússia, na sequência do referido bloqueio de 2014.
“A Bielorrússia é o país com a maior produção de leite per capita do mundo”, revelou José Quintana, fundador da Economía Láctea. Em 2020, exportou 2,4 bilhões de dólares de produtos lácteos e projeta chegar a 2030 exportando 4 bilhões, de acordo com as projeções oficiais, especulando sobre a abertura de grandes explorações leiteiras.
As exportações em 2021 teriam totalizado 1,088 milhões de toneladas, das quais 832 mil toneladas foram para a Rússia, principalmente queijo, fermentados e leite fluido. De acordo com as informações fornecidas pela consultoria, o governo quer ir migrando as exportações para outros destinos na busca de um novo equilíbrio, que seria: 1/3 para a Rússia, 1/3 para a UE e 1/3 para outros países.
“Todos os objetivos já eram ambiciosos antes do início da guerra, crescer 66% nas exportações em 10 anos e exportar mais de um bilhão de dólares em produtos lácteos para a UE”, detalhava o relatório da Economía Láctea. E, “já em Dezembro, a Bielorrússia tinha recebido sanções que se estimava serem suficientes para fazer cair o PIB em 10%, imagine o que poderá acontecer agora, uma vez que muitas das sanções contra a Rússia são estendidas à Bielorrússia”.
Questões futuras
Qualquer que seja o cenário analisado, mesmo que o conflito não se agrave, Quintana admite que “as consequências para a economia da região em conflito serão muito graves, com quedas na atividade econômica, no PIB e no consumo”.
Neste contexto, talvez a questão principal seja o que irá acontecer à indústria leiteira e às exportações da Bielorrússia. “Se o consumo na Rússia cair, e portanto as importações, a produção bielorussa irá cair, acompanhando a crise econômica que certamente enfrentará como país satélite da Rússia, ou irá procurar outros mercados? Os custos de produção já dispararam, pelo menos por agora”, analisou a consultoria.
E concluiu: “talvez haja uma mistura de ambos, uma queda na produção e uma procura de novos mercados, mas a produção bielorussa é uma variável a seguir, assim como o consumo russo e as importações e custos de produção. Por sua vez, os volumes que a Ucrânia opera no mercado internacional não parecem ser suficientemente significativos para afetar os preços”.
Fonte: Edairy News