O que não se mede, não se controla!

O que não se mede, não se controla!

18 de março, 2019

Autora: Katya Castro*

No mundo de hoje, o produtor de leite é cercado de tecnologias e informações diversas prontamente disponíveis, basta um clique e uma avalanche de informações surge diante de seus olhos: Provas de Tipo, Produção, Classificação, Pedigrees completos, etc...Mas que tal voltarmos ao passado, quando o criador buscava melhorar suas vacas mas não tinha as ferramentas e os conhecimentos do mundo moderno da Pecuaria de Leite. É certo que graças ao “cow sence” (a percepção como selecionador de alguns criadores), grandes touros e memoráveis vacas foram construídas ao longo do tempo, produzindo indivíduos de impacto e que trouxeram grande progresso genético ao gado leiteiro de modo geral.

Uma prática comum entre os criadores antes da "Era da Avaliação Genética" era chamada de “Line Breeding” - Acasalamento em Linha ou de Linhagem - cruzando animais que possuíam um relacionamento muito próximo. Na prática ao identificar no rebanho uma família que possuía os atributos que o criador buscava, a vaca ou touro era dobrada, triplicada ou quadruplicada no pedigree das gerações seguintes.

O acasalamento de indivíduos de parentesco próximo é denominado tecnicamente como “INBREEDDING” ou CONSANGUINIDADE. Isto se trata de relacionamentos que estão acima da média da população, por ter um ou mais ancestrais e indivíduos parentes em comum na composição de seu pedigree. Entre os tipos de Consanguinidade há a mais próxima, como o cruzamento de irmãos completos com irmãs completas, ou de pais com filhos. Já no “Line Breeding” , em Linha, há a repetição do acasalamento com um ancestral que aparece mais atrás no pedigree, tendo a finalidade de concentrar a herança de características desejadas de animais preferidos.

A Consanguinidade é expressa em ‘Porcentagem’. Na prova Americana, ela é tratada por Coeficiente de Consanguinidade e na Canadense por Porcentagem de Consanguinidade.  Aqui temos alguns exemplos de grau de parentesco e sua % correspondente:

Irmão Completo = 25%

Meio Irmão = 12,5%

Primos 1o.Grau = 6,25%

Primos 2o.grau = 3,13%

Através de pesquisas ao longo dos anos, o nível de Consanguinidade em todas as Raças Leiteiras pode ser mensurado e seus efeitos estudados. A seleção para aumentar a produção e melhoramento de Tipo colocou em destaque um limitado número de Touros e Vacas muito comuns na formação dos touros Top, de maior influência sobre as gerações futuras. Este conjunto trouxe, junto com o progresso genético, o aumento crescente da Consanguinidade, conforme demonstrado no gráfico abaixo.

Fica muito claro que os animais de hoje são mais consanguíneos que seus ancestrais. E, por isso, nos tempos atuais a Consanguinidade se tornou num fator preocupante que tem seus prós e contras (em maior número).

Vantagens:

- Aumenta a homozigose e reduz a variação genética;

- Possibilita a descoberta de genes recessivos indesejáveis, produzidos pela homozigoze, e sua eliminação  por meio de testes;

- Possibilita a divisão da população em linhagens diferentes.

Desvantagens:

- Produtos mais susceptíveis a doenças;

- Difícil definir limites de uso seguro, para evitar os efeitos negativos;

- Menor vitalidade no desenvolvimento inicial de bezerros;

- A homozigoze resultante promove o aparecimento de genes em pares, tanto bons como ruins, produzindo tanto os melhores como os piores animais;

- Cada 1% Consanguinidade resulta em  -22 a -24 dólares na Lucratividade Vitalícia de uma vaca, tendo efeito cumulativo no rebanho;

- Menos 47 libras de Leite a cada 1% de Consanguinidade, na primeira lactação de Vacas Jersey;

- Redução da Longevidade e da Performance Produtiva e Reprodutiva;

- Aumento da idade para atingir a Puberdade e do Intervalo Entre Partos.

Estudos realizados pela Universidade da Virginia puderam quantificar tais perdas reais para cada 1% de Consanguinidade1.

O que fazer então diante de uma situação onde muitos criadores tem ciência da questão da Consanguinidade, porém não conhecem sua extensão? Colocamos em destaque novamente o tema deste artigo “O QUE NÃO SE MEDE, NÃO SE CONTROLA!”   A Consanguinidade muitas vezes é um preço que pagamos em busca de um grande progresso genético!

Não devemos deixar de usar um touro Top com filhas em destaque e valorizadas no mercado por causa de sua % Consanguinidade mais elevada, se o ganho genético que ele pode produzir for superior às perdas. Na verdade não eliminamos a Consanguinidade, mas ela deve sim ser controlada no rebanho.  

O primeiro passo é manter boa e completa Identificação dos animais, tanto na linha materna como na paterna. O cálculo da Consanguinidade de um animal hoje pode ser feito de duas maneiras, pelo Pedigree ou pela Avaliação Genômica. Pelo Pedigree, demanda tempo e informação a fundo, até a 4ª. ou 5ª. geração, localizando todos os pontos em comum com Touros e Vacas que eventualmente apareçam repetidos na linha Materna e Paterna.

Graças à tecnologia da Avaliação Genômica, a “CONSANGUINIDADE GENÔMICA”  é uma medida direta da homozigoze herdada pelo indivíduo, dos genes em comum observados no genótipo do DNA. Além disso, é possível também ter uma expectativa da Consanguinidade na geração futura, que nas Provas dos Touros aparece como GFI – Genomic Future Inbreeding (Consanguinidade Futura Genômica); ou seja, uma estimativa da Consanguinidade esperada nas filhas de um touro se fosse acasalado ao acaso com a população referência genotipada de fêmeas nascidas nos últimos 10 anos. Anteriormente, este cálculo era feito usando a Consanguinidade calculada pelo Pedigree e a simulação era feita sobre 1.000 acasalamentos ao acaso das nascidas nos últimos 5 anos. Para a raça Jersey, com os dados fornecidos pela AJCA (Associação Jersey EUA), é chamado de EFI – Expected Future Inbreeding (Consanguinidade Futura Esperada).

Comprovadamente, tanto o cálculo pelo pedigree como pelo teste genômico demonstraram ser muito efetivos como estratégia de controle da Consanguinidade em um rebanho. Entretanto, o GFI tem sido mais utilizado não apenas por sua maior praticidade, mas também por ser uma medida real feita diretamente no DNA. Ambos  GFI/EFI dos touros de Inseminação em atividade podem ser facilmente consultados no site especial do Sumário da AJCA, conhecido como o Green Book da Raça Jersey : http://greenbook.usjersey.com/Bulls.aspx

Apesar dos números, não devemos nos alarmar. Conscientização, Controle de Dados e Informação Técnica de confiança são nossos grandes aliados no desafio de atingir bom progresso genético, em equilíbrio com níveis aceitáveis de Consanguinidade no rebanho. Tanto as Centrais de Inseminação como as Associações tem unido esforços na identificação de reprodutores com níveis menores de Consanguinidade, mas de grande valor genético. A exemplo do programa GPD – Programa de Diversidade Genética – da AJCA/EUA , que incentiva a amostragem em teste de progênie de tourinhos jovens com maior diversidade genética. Qualificam para o programa touros abaixo de 6%GFI e hoje com +202JPI ou +43lbs Proteína ou +485NM$. Além disso, Geneticistas e selecionadores acreditam que, futuramente, quando mais animais tiverem sido submetidos ao teste genômico, deverão surgir novos indivíduos de grande valor genético e com origem diversificada, um refresco em nossos pedigrees.

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1 - http://www.pubs.ext.vt.edu/404/404-080/404-080.html

 

*Katya Castro, zootecnista formada pela UNESP de Jaboticabal, Master In Dairy Administration pela Clinica do Leite - ESALQ/USP. Atua no setor de produção de leite há mais de 20 anos, com atuação no Brasil, Estados Unidos e Canadá. Tem extensos conhecimentos em Julgamento & Conformação de gado leiteiro. É especialista em Melhoramento Genético e Avaliação Genômica para Seleção de Gado Holandês e Jersey. Já publicou diversos artigos técnicos, bem como realizou muitas traduções técnicas e palestras. Tem sólidos conhecimentos em: Sistema de Alojamento Compost Barn, Alimentador Automático de Bezerras Calf Feeder, Sistema de Ordenha Robotizada e Criação de Bezerras. Master In Dairy Administration pela Clinica do Leite - ESALQ/USP.

 

Perfil no LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/katya-castro-4ab57b14/

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