João Ricardo Alves Pereira
Zootecnista, Doutor em Nutrição Animal e Pastagens
jricardouepg@uol.com.br
O melhor investimento na pecuária leiteira: Guardar forragens de qualidade!
13 de fevereiro, 2019
Autor: Dr. João Ricardo Alves Pereira*
Dentre os maiores desafios para o ano que se inicia já temos a certeza que será, mais uma vez, um ano de elevados custos de produção. Sendo a alimentação o maior componente desses custos podemos entender que os nossos produtores de leite estão preocupados com quanto vai custar cada quilo de matéria seca do que seu rebanho vai consumir durante o ano. Entendido o problema, o que podemos fazer para enfrentá-lo?
Num primeiro momento vamos pensar pelo “lado da vaca”. Na tabela abaixo temos a exigência nutricional de uma vaca para diferentes produtividades, sem muitos detalhes ou interações complexas, de forma que o produtor possa entender mais facilmente.
Se tomarmos como exemplo uma vaca com produtividade diária de 20 kg de leite, ela precisa ingerir em torno de 11,07 Kg de energia (NDT) e cerca de 2,30 Kg de proteína (PB), contidos nos 16,7 Kg de matéria seca que ela deve consumir. Caso ela não tenha eficiência produtiva (boa genética); ou seja, de “aptidão duvidosa” (nem carne, nem leite) parte desses nutrientes será convertida em “sebo” e a produtividade será menor. Mas, deixemos isso de lado.
Para atender essas exigências, o produtor terá que fazer uma combinação entre alimentos volumosos - como pastagens, silagens, fenos, capineiras e alimentos concentrados - basicamente milho, farelo de soja e “eventuais substitutos”. Essa combinação tem que respeitar níveis de fibra, minerais, gorduras e proteínas de diferentes degradabilidades, somados a alguns aditivos.
Embora tenha apresentado alguma queda nos últimos meses, o valor da saca de milho ainda permanece em patamares elevados em relação à média de anos anteriores. O mesmo acontece com o farelo de soja, que tem seu preço atrelado ao grão. Persistindo o cenário atual não há expectativa de termos menores custos com esses alimentos na forma de rações concentradas nos próximos meses.
Alguns produtores, e mesmo técnicos, criam a expectativa de encontrar resíduos ou subprodutos de baixo custo como fontes alternativas. A questão é que o que tem qualidade e oferta já deixou de ser subproduto, e muito menos resíduo, há muitos anos. A polpa cítrica e a casca de soja têm seus preços atrelados ao do milho e são vendidos por contrato (caso da polpa). O caroço de algodão já tem contrato de venda lá na lavoura e seu custo final, posto na propriedade, em muitas regiões já supera o farelo de soja. Se o preço não for favorável somente algumas dietas especiais justificam o uso desses produtos. Existem outros tantos produtos no mercado que se tivessem alguma qualidade não seriam chamados de “resíduos”. É que na verdade essa denominação cria a falsa ilusão de alguma coisa barata comprada por alguém um pouco mais esperto.
Nos sobra então a possibilidade de reduzir o custo com alimentação investindo na produção de volumosos de qualidade.
O investimento em pastagens, com oferta e qualidade, é obrigatório para quem tem nela a base de alimentação do rebanho. Lembrando que correção de solo, adubação e água são fundamentais no sistema. Mesmo os sistemas que dispõem de irrigação precisam ter volumosos complementares para os períodos de menor oferta de forragem. Nutrição de vacas é colocar bioquímica e fisiologia na forma de tabuada. Para a vaca atingir a produtividade esperada tem, obrigatoriamente, que consumir a quantidade de nutrientes exigida. Se a pastagem não for suficiente deve ser completada com concentrado e/ou volumoso.
Por que produzir volumosos de qualidade? No quadro abaixo temos uma simulação bem simples. Vamos considerar a vaca de 20 Kg de leite/dia, consumindo a mesma quantidade de matéria seca (8,4 Kg – 50% da ingestão) de três diferentes volumosos e estimar a quantidade de concentrado necessário, somente com base na energia (NDT), para corrigir o déficit.
É evidente que quanto maior a qualidade do volumoso, menor será a demanda de concentrado para atender as exigências da vaca e, mesmo que desconsiderado no exemplo, temos a vantagem adicional de que quanto melhor o volumoso, maior será a ingestão pela vaca, em função de sua maior digestibilidade. O contrário também é verdadeiro, e quanto menor a qualidade do volumoso (mais fibroso) menor será a ingestão.
Em relação aos custos, quanto maior a produtividade da lavoura menor o custo do volumoso produzido. Produzir 40 t/ha de silagem de milho, por exemplo, custa quase 30% menos do que produzir 25 t/ha, fora a redução de custos com a menor demanda por concentrado.
Se imaginarmos como investimento fazer uma “poupança” na forma de alimentos conservados, como silagens de milho ou sorgo; pré-secados de capins ou feno sempre será rentável. O custo para se produzir, principalmente alimentos energéticos, é menor do que comprar fora e os investimentos em fertilidade do solo, silos, irrigação e equipamentos podem ser feitos de forma planejada. Com algumas exceções, a valorização do litro de leite está associada a menor oferta do produto que, por sua vez, está diretamente ligada a períodos de estiagem ou valorização de commodities, de modo que os riscos de se perder dinheiro guardando comida na propriedade sejam quase nulos. Vamos investir?
*Dr. João Ricardo Pereira - Professor Adjunto da Universidade Estadual de Ponta Grossa, possui graduação em Zootecnia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Mestrado em Nutrição Animal e Pastagens pela ESALQ/USP e Doutorado em Zootecnia pela UNESP/Jaboticabal. É palestrante e consultor de empresas nas áreas de conservação de forragens e nutrição animal, ganhador do Prêmio Impacto 2012 Milkpoint, técnico do ano no Troféu Agroleite 2016.