Maria Flavia Tavares
Economista, Doutora em Agronegócios, Proprietária da MFT Consultoria
mariaflavia@mftconagro.com.br
Desafio do setor lácteo
17 de março, 2019
Autora: Dra. Maria Flávia Tavares*
O setor lácteo mundial está passando por um período de grandes turbulências, pois a partir de 2017 a demanda da China começou a desacelerar. O embargo ao comércio da Rússia e a retirada das quotas leiteiras da UE, levaram a um período de excesso de oferta e preços baixos. De acordo com a consultoria Deloitte, apesar disso, as perspectivas de longo prazo para o setor continuam positivas, devido a um crescimento da população mundial e mudanças nas dietas que estão aumentando a demanda por laticínios.
À medida que a renda sobe e as nações se tornam cada vez mais urbanizadas, as pessoas tendem a receber mais suas calorias de proteínas (incluindo produtos lácteos) em oposição a carboidratos básicos (principalmente grãos). Segundo esta mesma consultoria, a demanda global por laticínios deverá aumentar em 2,5% ao ano até 2020, em grande parte impulsionada pelo aumento da urbanização e aumento dos rendimentos nos mercados emergentes.
Mas, o setor de laticínios está lidando com uma série de desafios. Entre eles podemos citar a adoção de novas tecnologias, pois o setor precisa se adaptar para poder sobreviver. No Agronegócio brasileiro, as propriedades rurais possuem diversos tamanhos, produzem culturas diferentes e o pequeno produtor possui limitações técnicas e gerenciais, que o impedem de atender às exigências do mercado consumidor.
No caso especifico do leite, muitas das propriedades rurais são pequenas e familiares, e garantem o sustento da família. É necessário promover a eficiência produtiva em equilíbrio com a eficiência econômica e para isso a propriedade rural precisa se profissionalizar, se modernizar e ser encarada como uma empresa de fato.
Na propriedade rural, as tecnologias emergentes e a "informatização" da agricultura estão fornecendo a agricultores informações quantificáveis, que podem ser medidas e monitoradas continuamente, e estas informações ajudam na tomada de decisões.
Os agricultores podem complementar essas tecnologias com práticas operacionais e comerciais adequadas, para verem a sua rentabilidade aumentar significativamente. Estas tecnologias também podem ajudar os agricultores a expandirem a sua produção de forma rentável e sustentável.
As tecnologias proporcionam uma grande oportunidade de crescimento, mas um dos grandes problemas que vemos hoje é o choque de gerações na propriedade, pois - em algum momento - os filhos terão de assumir trazendo novos conhecimentos e perspectivas para a fazenda. Um grande desafio do Agronegócio brasileiro e mundial está relacionado à falta de interesse dos herdeiros em permanecerem na atividade.
A seguir faço uma breve comparação entre as diferentes gerações de agricultores no Brasil e no mundo, começando pelo agricultor maduro, nascido antes de 1945. Ele é o patriarca, que entregou o controle parcial ou total do dia-a-dia da fazenda para o seu sucessor. Ele considera a tecnologia hard tech como mecanização, genética e economias de escala.Geralmente é cético da tecnologia digital, mas possui na fazenda porque as gerações mais jovens consomem este tipo de tecnologia mais moderna. Eles preferem que as suas conexões sejam mais pessoais e por telefone, e a sua atitude é extremamente leal, principalmente para aqueles que o ajudaram a crescer nos negócios.
Outro perfil é o do tradicional que nasceu entre 1946 e 1964 e pertence a uma geração que teve um impacto significativo na economia. Ele é o CEO, quer ter o controle e gosta de ficar de mãos sujas, de lidar diretamente com a terra, mas também divide o seu tempo ficando no escritório. Está propenso a adaptar tecnologia na fazenda e no escritório. Este tipo de agricultor confia em marcas tradicionais,sendo fiel a estas marcas. A sua conexão com o mundo mistura o analógico e o digital, e observa a gestão dos outros fazendeiros.
O agricultor da geração X, nascido entre 1965 e 1980, está menos presente na propriedade rural, as mulheres participam mais ativamente na sua gestão, tendo o papel de parceiras ou como tomadoras de decisão. Em relação à tecnologia adota e integra todos os aspectos do processo de gestão, sendo digitalmente experiente.
Os nascidos entre 1981-1996 são chamados Millenials e são considerados os empreendedores ou empreendedoras, o(a) agricultor(a) de primeira geração. Está constantemente ligado à tecnologia, preocupado com sustentabilidade, biotecnologia e preferências do consumidor. A sua conexão é com reunião de amigos, se interessa pela educação, participando de cursos, eventos e palestras do setor. Também tem participação ativa nas mídias sociais e pesquisas de textos na internet. Prioriza marcas que buscam desempenho e política social corporativa, transparência, ética e responsabilidade social
O último grupo são os nascidos a partir do ano de 1997, chamados de Geração Z, este agricultor pode ser considerado o aprendiz, que tem possibilidades infinitas de aprendizado, mas precisa ser prático e responsável. A sua conexão com o mundo é com qualquer aparelho móvel, é aberto, inovador e orientado por propósitos. Busca um mundo melhor e mais sustentável. Os agricultores mais jovens não são diferentes dos consumidores da sua geração, pois querem estar na vanguarda da tecnologia, pavimentar seu próprio caminho e não fazer algo apenas porque é sempre assim. Eles querem transformar o mundo.
A tecnologia pode ser um atrativo para o jovem sucessor permanecer na atividade leiteira, modernizando a produção, agregando valor ao seu produto e aumentando a sua rentabilidade. As tecnologias estão sendo cada vez mais desenvolvidas e aplicadas nas propriedades rurais para manter a sustentabilidade na produção agrícola. No entanto, a adoção dessas tecnologias com o objetivo de alcançar a sustentabilidade envolve incertezas e trade-offs; ou seja, você precisa abrir mão de algo para ter o que precisa. Para que sejam adotadas estas tecnologias agrícolas sustentáveis é preciso qualificar os agricultores, deve haver o compartilhamento de informações e um fácil acesso a recursos financeiros.
*Maria Flávia Tavares formada em Ciências Econômicas pela UNESP, tem mestrado em Administração e Política de Recursos Minerais pela UNICAMP e doutorado em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Atua como árbitra na Câmara Arbitral da Bolsa Brasileira de Mercadorias. Atualmente, é diretora da MFT Consultoria em Agronegócios onde trabalha com qualificação profissional no Agronegócio. Também elabora estudos de Inteligência de Mercado e Análises Setoriais e conteúdos para cursos EAD. Recebeu o Troféu Destaque Marketing Rural 2013, concedido pela Comissão das Produtoras Rurais da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (FARSUL).
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